Tudo estará bem, enquanto os laços que nos unem forem maiores e mais fortes do que aqueles que nos afastariam."
(Trecho da Oração do Amigo )

Eu sabia que estava sendo amada, talvez como nunca em toda a minha vida. Mas absolutamente incrível. Só ele conheceu uma mulher corajosa que admitiu todos os medos, todas as neuroses, todas as inseguranças, toda a parte feia e real que todo mundo quer esconder com chapinhas, peitos falsos, bundas falsas, bebidas, poses, frases de efeito, saltos altos, maquiagem e risadas altas. Ninguém nunca me viu tão nua e transparente como você, ninguém nunca soube do meu medo de nadar em lugares muito profundos, de amar demais, de se perder um pouco de tanto amar, de não ser boa o suficiente. Só ele viu meu corpo de verdade, minha alma de verdade, meu prazer de verdade, meu choro baixinho embaixo da coberta com medo de não ser bonita e inteligente. Só para ele eu me desmontei inteira porque confiei que ele me amaria mesmo eu sendo desfigurada, intensa e verdadeira, como um quadro do Picasso. Quero que ele veja o quanto mudei por causa dele. Não foi só o muque que ficou mais duro, mas minha autopiedade também aprendeu a ser menos molenga. Talvez meu amor tenha aprendido a ser menos amor só para nunca deixar de ser amor. Impressionante como a gente sofre por nada. Um cheiro que mexe com você, um jeito de olhar contido, uma idéia inteligente, várias na verdade. Não, não é nada disso, a gente sofre é pela impossibilidade. Ele sabe que você nunca será mais uma daquelas mulheres sem nome, com quem ele janta ou come, pra sentir de dentro da redoma de vidro um sol artificial. Ele sabe e afirma pra você, todos os dias, que você é e sempre será única pra ele. A verdade é que eu ainda acredito em reencarnação. Seja ele, seja o homem que perde um segundo de ar quando me vê. Você segura minha mão e eu me sinto segura. E eu tenho vontade de segurar seu rosto e ordenar que você seja esperto e jamais me perca e seja feliz. E entenda que temos tudo o que duas pessoas precisam para ser feliz. A gente dá muitas risadas juntos. A gente admira o outro desde o dedinho do pé até onde cada um chegou sozinho. A gente acha que o mundo está maluco e sonha com a praia de janeiro e com sonos jamais despertados antes do meio-dia. A gente tem certeza de que nenhum perfume do mundo é melhor do que a nuca do outro no final do dia. A gente se reconheceu de longa data quando se viu pela primeira vez na vida. E do quanto você jamais vai encontrar uma mulher que nem eu nesses lugares deprê em que procurava. Porque eu me banco sozinha e eu me banco com um coração. E não me sinto fraca ou boba ou perdendo meu tempo por causa disso.
"Dia desses encontrei um velho diário. Era meu diário de 1999, um caderno de capa dura com temas florais e folhas branquinhas esperando por palavras apaixonadas de uma adolescente de 17 anos. Entre um trecho de música e um discurso irritado sobre o grupinho que pegava no meu pé, você sempre estava lá. Num ingresso de cinema ou num trecho de algum livro, você estava lá. Naquela música do Chico ou no versinho do Drummond, em cada linha, entrelinha e até nos desenhos toscos de uma garota boba e apaixonada. Era você. Sempre foi você."
Poderia ser tudo mais fácil e menos feliz se tivéssemos nos desencontrado naquele dia em que você chegou na minha vida, mas por ventura não foi assim. Desde que tu chegaste, o meu silêncio se transformou em grito. E foi entre o primeiro e o terceiro encontro que o meu coração perdeu a paz de ser o único dono de si.
Lembro que chegaste num sábado improvável, de calor sem sol, céu sem azul, com teus olhos cinza e eu não te reconheci. Não como te reconheço hoje, com todas as cores que agora vejo e que antes eu não percebia. Reconhecia somente o que era relativo às minhas expectativas sobre tudo que encontraria nas festinhas de carnaval, sobre a minha impaciência na muvuca de shows de rua cheio de pessoas - que eu pensava que tu eras só mais uma delas-, e sobre as dúvidas e frustrações da noite anterior: foi justo quando eu pensei que eu realmente não tinha sorte nenhuma que você chegou pra me mostrar que eu estava equivocada.
Lembro que quando tivemos a oportunidade nos encontrarmos, quando estávamos a sós, eu e você, eu senti sede e me fui sem pensar, como se o acaso, ou a natureza (como você preferir chamar), não pudesse ser contrariado, como se tivesse realmente que acontecer, ainda que fosse tarde. MAKTUB. Porque antes disso era como se alguém soprasse ou sussurrasse algo que eu não entendia a cada vez que você me ligava ou quando nos encontros com amigos você vinha e se sentava ao meu lado. Eu devia suspeitar que todo aquele riso que você me causava não era lá dos mais comuns.
Desde que você chegou na minha vida eu tenho tido a sensação de que o tempo de uma vida inteira é pouco demais pra tudo que se pode ser, criar e tentar; uma semana é como um segundo ao teu lado. Tenho sentido uma fome louca de tudo, de respirar fundo e aproveitar a vida, de aproveitar você. E não me intimidam esses doismil quilômetros que estão entre nós. Eu estarei em ti, e tu aqui estarás – dentro - cultivado em mim como se fosse flor. E nossas lembranças serão como força incontrolável pros dias que eu, sem pensar em nada além de ti, vou correr pro aeroporto e entrar no primeiro avião que me leve até você, pra estar em paz outra vez. Porque do teu lado eu me sinto como quem sonha, como se precisasse de muito-pouco-quase-nada pra estar completa. Não sinto fome, não tenho sono, só vontade de te descobrir e de ser tua descoberta. E é entre os teus braços claros que eu não me sinto só. Porque apesar de toda essa capa de “que-forte-a-menina-indestrutível!”, eu sou débil e boba demais, fraca e vulnerável quando você dispara um olhar na minha direção. (“No me mires que me encierras... si, ahora es igual, mírame que ya me tienes encerrada por completo”). O meu sorriso é mais feliz contigo e eu amo conhecer teu mundo, as ruas que você passa, as pessoas que você ama, a cama que você dorme e o que você vê quando abre a tua janela ao despertar.
Eu quero ir em ti, quero ir até onde possamos ir, porque também confesso e aceito que já não sou tão singular, e que já me perdi pra ti faz tempos. Resolvi pular bem do alto dessa pedra e cair de vez nesse rio, e que a correnteza me leve pra esse lugar tranquilo que eu tenho a impressão de ver de relance a cada vez que estamos juntos.
Que o universo nos tenha reservado um amanhã bonito.
Segura a minha mão com força e não solte.
Que venha o desafio.
Por Dani C.

Olhando assim do alto parecem numerosas ao triplo.




